domingo, 10 de junho de 2012

Porquê os ricos deveriam pagar mais: o imposto sobre grandes fortunas.

"Deve-se considerar aqui que não há coisa mais difícil, nem de êxito mais duvidoso, nem mais perigosa, do que o estabelecimento de novas leis. O novo legislador terá por inimigos todos aqueles a quem as leis antigas beneficiavam, e terá tímidos defensores nos que forem beneficiados pelo novo estado de coisas. Essa fraqueza nasce parte do medo dos adversários, parte da incredulidade dos homens, que não acreditam na verdade das coisas novas senão depois de uma sólida experiência".
Nicolau Maquiavel, O Príncipe.


    O estabelecimento e a cobrança de tributos atestam - ou deveriam atestar - o compromisso do Estado na construção de serviços e bens públicos que constituem a contrapartida e a materialização das contribuições de cada indivíduo. O tributo, portanto, legitima a atuação do Estado como guardião da ordem e do desenvolvimento social.
Como toda atividade humana, a competência para tributar é guiada por princípios que auxiliariam o administrador para uma gestão fiscal mais eficiente e eficaz. Dentre os princípios que caracterizariam um sistema tributário dito ideal, os que se relacionam diretamente com a justiça social são os da progressividade e equidade. Segundo Giambiagi e Além (2000), um sistema tributário progressivo e equitativo pressupõe que cada indivíduo deve arcar com uma parcela contributiva que seja "justa". Essa "justiça" pode (e deve!) ser avaliada de acordo com a capacidade de pagamento de cada indivíduo.
 As três bases tributáveis no Brasil - consumo (bens e serviços), renda e propriedade – possuem cada uma diferentes efeitos sobre a capacidade econômica do contribuinte. Enquanto os impostos incidentes sobre a renda e propriedade (individuais) têm como princípio norteador a progressividade – paga mais quem tem mais – o imposto sobre o consumo é originalmente regressivo, ou seja, indivíduos com faixas de menor rendimento financeiro pagam valores proporcionalmente maiores por produtos e serviços idênticos, se comparados aqueles que possuem mais recursos.
Embora a renda seja a maior base passível de tributação, sua participação na carga total do PIB em 2009 era de apenas 20,6% em comparação a participação dos tributos sobre consumo, com 46,1% do PIB no mesmo ano (Brasil/ CDES, 2009 apud Marcelo Pagliosa). O sistema tributário brasileiro contribui, portanto, para a acentuação das desigualdades sociais ao onerar em mesma medida quem possui rendimentos menores em relação aqueles com maior renda.
No sentido de garantir a progressividade dos tributos e desonerar setores da sociedade prejudicados pela incidência tributária que produz disfunções, a Constituição Federal prevê em seu artigo 153 inciso VII o imposto sobre grandes fortunas, de competência federal, a ser regulado por lei complementar. A primeira proposta de lei complementar para regular o tema foi de autoria de Fernando Henrique Cardoso (PLP 162/89 – 202/89) aprovada pelo Senado e depois encaminhada a Câmara dos Deputados, com os pareceres da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e Comissão de Finanças e Tributação (CFT). Há ainda outros três projetos anexados ao primeiro, igualmente sem votação (PLP 108/89; PLP 218/90; PLP 268/ 90). O mais recente projeto de Lei de autoria da Deputada Luciana Genro (PLP 277/08) também já foi aprovado pela CCJ e CTF e encontra-se, segundo informações da Câmara dos Deputados, pronto para pauta no plenário. O conteúdo da Lei prevê alíquotas de 1% até 5%, partindo de uma quantia de 2 milhões de reais que é isenta. A principal mudança do PLP 277/ 08 em relação aos que o precedem é a impossibilidade de dedução no imposto de renda do valor pago a título de IGF. Segundo justificativa de Luciana Genro, não faz sentido a existência de uma dedução, na medida em que o objetivo da lei é exatamente aumentar os tributos da camada da população com maior capacidade contributiva.
Quais seriam os motivos para que, mesmo após duas décadas da promulgação da Constituição Federal, as propostas de lei complementar para o imposto sobre grandes fortunas não tenham sido aprovadas? É fato que este aspecto constitui apenas um dos pontos do nó tributário brasileiro.  A pluralidade de opiniões, diagnósticos e demandas dificulta a tomada de decisão, "travando" a agenda governamental para esta área. Para além deste fato, o sentimento público em relação à cobrança de tributos de forma geral é o de se tratar de uma pena imposta pelo Estado, sem a contrapartida de benefícios tangíveis para a coletividade.
Os argumentos legais que justificam a criação do imposto sobre grandes fortunas são 1) a previsão Constitucional para sua existência e 2) a promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal (Nº 101), que em seu Artigo 11 prevê:
"Art. 11. Constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos da competência constitucional do ente da Federação".
Há, portanto, a obrigatoriedade da instituição e arrecadação de tributos previstos pela Constituição Federal por parte do ente a quem a prerrogativa pertencer. No caso específico do imposto sobre grandes fortunas, é de responsabilidade da união sua cobrança.
O imposto sobre grandes fortunas  funcionaria como ferramenta crucial à criação de um sistema tributário mais progressivo e equitativo. Ele pode contribuir para que haja a desoneração do fluxo econômico, criando incentivos para maior produção, consumo e lucro. Para além deste fato, o IGF é necessário no efetivo controle - e sanção - dos que se utilizam da "engenharia financeira" na sonegação de contribuições tributárias. Parece correto dizer que aqueles mais ricos possam contribuir com maiores parcelas, promovendo melhorias na sociedade, incentivando o consumo e o desenvolvimento social.

Bruna Barcellos Mattos - Gestão de Políticas Públicas/ 5º semestre
Direito Financeiro – Profº Dr. Marcelo Arno Nerling

Referências Bibliográficas
Câmara dos Deputados. Disponível em: < http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=388149>. Acesso: 01 jun 2012.
CARVALHO, Marcelo Pagliosa. As políticas de educação de jovens e adultos nos governos Lula (2003 – 2010): incongruências do financiamento insuficiente. Universidade de São Paulo – Faculdade de Educação, 2011. Tese (doutorado).
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso: 03 jun 2012.
GIAMBIAGI, Fábio; ALÉM, Ana Cláudia. Finanças Públicas - Teoria e Prática no Brasil. Editora Campus - 2ª Edição, 2000.
Lei Complementar Nº 101 (Responsabilidade Fiscal). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp101.htm>
. Acesso: 29 mai 2012.

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