Recentemente os poderes da república, executivo e judiciário, protagonizaram forte disputa institucional acerca da fixação dos subsídios dos magistrados e dos vencimentos dos servidores do judiciário. O ponto de discórdia deu-se em função da diferente interpretação dos dispositivos constitucionais e legais sob matéria orçamentária que cada um dos atores confere. Ao tentar impor "goela abaixo" o aumento de seus vencimentos ao país, inserindo os valores na proposta orçamentária e encaminhando-a ao executivo para juntá-la e remetê-la ao legislativo, o poder judiciário não contava que, a pedido da presidência da república, a secretaria do orçamento federal ignoraria a proposta de aumento do judiciário e não o enviaria ao congresso.
O judiciário, associações de juízes e servidores alegaram atentado à constituição, já que o artigo 85 da constituição federal coloca que atentar contra a própria carta maior e contra o livre exercício dos poderes, a lei orçamentária e a probidade na administração são crimes de responsabilidade do presidente da república. Deveria o executivo apenas juntar a proposta e enviá-la ao congresso? Mas de onde sairiam os recursos tendo em vista que os mesmos já estavam alocados em programas governamentais diversos no projeto de lei? Deveria o executivo então "cortar as asas" do judiciário e simplesmente deixar de lado a proposta dos tribunais? A celeuma aconteceu nestes termos, e uma pitada do imbróglio jurídico-político parte da verificação do artigo 99 da lei suprema que garante autonomia administrativa e financeira ao poder judiciário, porém avisa em seu parágrafo primeiro que as propostas orçamentárias do judiciário devem observar os limites que foram aprovados na LDO, que supostamente foram acordados entre os poderes. Aí claramente reside um grande problema. Como regra, a lei de diretrizes orçamentárias não é discutida fora do poder executivo, que tem grande poder de determinar a versão final da lei. O parágrafo quarto manda o poder executivo fazer os ajustes necessários caso o poder judiciário desrespeite o "acordo" inscrito na LDO. Não se ignora que a avaliação dos projetos de lei de diretrizes e do orçamento anual e sua respectiva fixação são prerrogativas do poder legislativo, consoante nos ensinam os artigos 165 a 169 da CF, porém dois pontos muito importantes também não podemos ignorar: Na lógica atual de nosso sistema político, do presidencialismo de coalizão, o poder executivo tem os instrumentos políticos necessários para "enquadrar" sua base de apoio e fazer valer sua vontade no texto final aprovados. Muito embora esta seja a regra atual, o funcionamento deste sistema comporta exceções. O segundo ponto, que acaba engessando um pouco o poder do congresso nacional em rearranjar as peças do sistema orçamentário aparece na alínea A do inciso segundo do parágrafo terceiro do artigo 166, que diz que emendas modificativas devem apontar a anulação da despesa em valor equivalente para comportá-la, porém sem afetar as dotações para pessoal.
Imagina-se que um gestor republicano saiba que ao fixar mais valores em despesas correntes, onde as despesas de pessoal são alocadas conforme o artigo 13 da lei 4320/64, diminui-se recursos a serem destinados às despesas de capital no seu subgrupo investimentos, onde são alocados recursos para que o Brasil se modernize, aperfeiçoando sua infraestrutura aeroportuária, seus portos, suas estradas, enfim, mais recursos públicos são liberados para diminuirmos os gargalos que tornam nossa economia menos competitiva, o chamado "custo Brasil" e portanto parte importante das amarras do crescimento podem ser liberadas.
O professor Luis Gustavo Bambini de Assis afirma em seu livro que: "o orçamento é a consequência de uma escolha política de prioridades e, como tal, reflete as necessidades consideradas mais importantes e que devem ser observadas pelo Estado brasileiro." Nesta linha, amplificando uma visão orçamentária sob o prisma político, afirmo que se o Estado existe para servir o cidadão, a harmonia entre os poderes prevista no artigo segundo da Carta Magna deve ser interpretada cumulativamente ao princípio da prevalência do interesse público ante ao privado e conseqüentemente havendo disputa orçamentária travada entre majoração de subsídios e salários da magistratura e dos servidores respectivamente em contraposição a mais recursos para as políticas públicas, sugere que a postura do poder executivo de não enviar a proposta original do judiciário foi acertada e que a interpretação da legislação pátria em matéria de direito financeiro deve sempre se orientar pelo interesse público, pois o equilíbrio orçamentário na averiguação da harmonia entre os poderes deve privilegiar o que é melhor para o Brasil e para todos os brasileiros.
Valdir Ferigolli Júnior, discente do 5º semestre da graduação em Gestão de Políticas Públicas - USP; Artigo apresentado para o aproveitamento da disciplina de Direito Financeiro, sob orientação do professor Dr. Marcelo Arno Nerling.
Referencias Bibliográficas
ASSIS, Luiz Gustavo Bambini de. Processo Legislativo e Orçamento Público: Função de controle do Parlamento. São Paulo, Saraiva, 1. Ed. 2012.
BRASIL. Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Luiz Roberto Curia, Livia Céspedes e Juliana Nicoletti. São Paulo,Saraiva,8.Ed.2012.
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