terça-feira, 3 de junho de 2008

TEXTOS PARA PROVA DE SMD

Stuart Hall - A Identidade em Questão
("Identidade Cultural na Pós-modernidade" - p. 07-22)
- três concepções de identidade
- o caráter da mudança na modernidade tardia
- o que está em jogo na questão das identidades
cap. 1) A identidade em questão
A questão da identidade está sendo extensamente discutida na teoria social. Em essência, o argumento é o seguinte: as velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundosocial, estão em declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduomoderno, até aqui visto como um sujeito unificado. A assim chamada "crise de identidade"é vista como parte de um processo mais amplo de mudança, que está deslocando asestruturas e processos centrais das sociedades modernas e abalando os quadros dereferência que davam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social.O propósito deste livro é explorar algumas das questões sobre a identidade cultural namodernidade tardia e avaliar se existe uma "crise de identidade", em que consiste essa crisee em que direção ela está indo. O livro se volta para questões como: Que pretendemos dizercom "crise de identidade"? Que acontecimentos recentes nas sociedades modernasprecipitam essa crise? Que formas ela toma? Quais são suas conseqüências potenciais? Aprimeira parte do livro ('caps. 1-2') lida com mudanças nos conceitos de identidade e de
sujeito. A segunda parte ('caps. 3-6') desenvolve esse argumento com relação a 'identidadesculturais' - aqueles aspectos de nossas identidades que surgem de nosso "pertencimento" aculturas étnicas, raciais, lingüísticas, religiosas e, acima de tudo, nacionais.Este livro é escrito a partir de uma posição basicamente simpática à afirmação de que asidentidades modernas estão sendo "descentradas", isto é, deslocadas ou fragmentadas. Seupropósito é o de explorar esta afirmação, ver o que ela implica, qualificá-la e discutir quaispodem ser suas prováveis conseqüências. Ao desenvolver o argumento, introduzo certascomplexidades e examino alguns aspectos contraditórios que a noção de "descentração",em sua forma mais simplificada, desconsidera.Conseqüentemente, as formulações deste livro são provisórias e abertas à contestação. Aopinião dentro da comunidade sociológica está ainda profundamente dividida quanto aesses assuntos. As tendências são demasiadamente recentes e ambíguas. O próprio conceito
com o qual estamos lidando, "identidade", é demasiadamente complexo, muito poucodesenvolvido e muito pouco compreendido na ciência social contemporânea para serdefinitivamente posto à prova. Como ocorre com muitos outros fenômenos sociais, éimpossível oferecer afirmações conclusivas ou fazer julgamentos seguros sobre as
alegações e proposições teóricas que estão sendo apresentadas. Deve-se ter isso em mente
ao se ler o restante do livro.Para aqueles/as teóricos/as que acreditam que as identidades modernas estão entrando emcolapso, o argumento se desenvolve da seguinte forma. Um tipo diferente de mudançaestrutural está transformando as sociedades modernas no final do século XX. Isso estáfragmentando as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça enacionalidade, que, no passado, nos tinham fornecido sólidas localizações como indivíduossociais. Estas transformações estão também mudando nossas identidades pessoais, abalando
a idéia que temos de nós próprios como sujeitos integrados. Esta perda de um "sentido de si" estável é chamada, algumas vezes, de deslocamento ou descentração do sujeito. Esse duplo deslocamento - descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmos - constitui uma "crise de identidade" para o indivíduo. Como observa o crítico cultural Kobena Mercer, "a identidade somente se torna uma questão
quando está em crise, quando algo que se supõe como fixo, coerente e estável é deslocado
pela experiência da dúvida e da incerteza" (Mercer, 1990, p.43). Esses processos de mudança, tomados em conjunto, representam um processo de transformação tão fundamental e abrangente que somos compelidos a perguntar se não é a própria modernidade que está sendo transformada. Este livro acrescenta uma nova dimensão a esse argumento: a afirmação de que naquilo que é descrito, algumas vezes, como nosso mundo pós-moderno, nós somos também "pós" relativamente a qualquer concepção essencialista ou fixa de identidade - algo que, desde o Iluminismo, se supõe definir o próprio núcleo ou essência de nosso ser e fundamentar nossa existência como sujeitos humanos. A fim de explorar essa afirmação, devo examinar primeiramente as definições de identidade e o caráter da mudança na modernidade tardia.
a) três concepções de identidade
Para os propósitos desta exposição, distinguirei três concepções muito diferentes de identidade, a saber, as concepções de identidade do:
a)sujeito do Iluminismo,
b)sujeito sociológico e
c)sujeito pós-moderno.
O sujeito do Iluminismo estava baseado numa concepção da pessoa humana como um indivíduo totalmente centrado, unificado, dotado das capacidades de razão, de consciência e de ação, cujo "centro" consistia num núcleo interior, que emergia pela primeira vez quando o sujeito nascia e com ele se desenvolvia, ainda que permanecendo essencialmente o mesmo - contínuo ou "idêntico" a ele - ao longo da existência do indivíduo. O centro
essencial do eu era a identidade de uma pessoa. Direi mais sobre isto em seguida, mas pode-se ver que essa era uma concepção muito "individualista" do sujeito e de sua identidade (na verdade, a identidade 'dele': já que o sujeito do Iluminismo era usualmente descrito como masculino). A noção de sujeito sociológico refletia a crescente complexidade do mundo moderno e a consciência de que este núcleo interior do sujeito não era autônomo e auto-suficiente, mas era formado na relação com "outras pessoas importantes para ele", que mediavam para o
sujeito os valores, sentidos e símbolos - a cultura - dos mundos que ele/ela habitava, G.H. Mead, C.H. Cooley e os interacionistas simbólicos são as figuras-chave na sociologia que elaboraram esta concepção "interativa" da identidade e do eu. De acordo com essa visão, que se tornou a concepção sociológica clássica da questão, a identidade é formada na "interação" entre o eu e a sociedade. O sujeito ainda tem um núcleo ou essência interior que
é o "eu real", mas este é formado e modificado num diálogo contínuo com os mundos culturais "exteriores" e as identidades que esses mundos oferecem. A identidade, nessa concepção sociológica, preenche o espaço entre o "interior" e o "exterior" - entre o mundo pessoal e o mundo público. O fato de que projetamos a "nós
próprios" nessas identidades culturais, ao mesmo tempo que internalizamos seus significados e valores, tornando-os "parte de nós" contribui para alinhar nossos sentimentos subjetivos com os lugares objetivos que ocupamos no mundo social e cultural. A identidade, então, costura (ou, para usar uma metáfora médica, "sutura") o sujeito à
estrutura. Estabiliza tanto o s sujeitos quanto os mundos culturais que eles habitam, tornando ambos reciprocamente mais unificados e predizíveis. Argumenta-se, entretanto, que são exatamente essas coisas que agora estão "mudando". O sujeito, previamente vivido como tendo uma identidade unificada e estável, está se
tornando fragm entado; composto não de uma única, mas de várias identidades, algumas vezes contraditórias ou não-resolvidas. Correspondentemente, as identidades, que compunham as paisagens sociais "lá fora" e que asseguravam nossa conformidade subjetiva com as "necessidades" objetivas da cultura, estão entrando em colapso, como resultado de mudanças estruturais e institucionais. O próprio processo de identificação, através do qual
nos projetamos em nossas identidades culturais, tornou-se mais provisório, variável e problemático.
Esse processo produz o sujeito pós-moderno, conceptualizado como não tendo uma identidade fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se uma "celebração móvel": formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (Hall, 1987). É
definida historicamente, e não biologicamente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um "eu" coerente. Dentro de nós há identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas. Se sentimos que temos uma identidade unificada desde o nascimento até a morte é apenas porque construímos uma cômoda estória sobre nós mesmos ou uma confortadora "narrativa do eu" (veja Hall, 1990). A identidade plenamente identificada, completa, segura e coerente é uma fantasia. Ao invés disso, à medida em que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar - ao menos temporariamente. Deve-se ter em mente que as três concepções de sujeito acima são, em alguma medida,
simplificações. No desenvolvimento do argumento, elas se tornarão mais complexas e qualificadas. Não obstante, elas se prestam como pontos de apoio para desenvolver o argumento central deste livro.
b) o caráter da mudança na modernidade tardia
Um outro aspecto desta questão da identidade está relacio nado ao caráter da mudança na modernidade tardia; em particular, ao processo de mudança conhecido como "globalização" e seu impacto sobre a identidade cultural.
Em essência, o argumento é que a mudança na modernidade tardia tem um caráter muito específico. Como Marx disse sobre a modernidade: é o permanente revolucionar da produção, o abalar ininterrupto de todas as condições
sociais, a incerteza e o movimento eternos... Todas as relações fixas e congeladas, com seu cortejo de vetustas representações e concepções, são dissolvidas, todas as relações recémformadas envelhecem antes de poderem ossificar-se. Tudo que é sólido se desmancha no ar... (Marx e Engels, 1973, p. 70) As sociedades modernas são, portanto, por definição, sociedades de mudança constante, rápida e permanente. Esta é a principal distinção entre as sociedades "tradicionais" e as "modernas". Anthony Giddens argumenta que: nas sociedades tradicionais, o passado é venerado e os símbolos são valorizados porque contêm e perpetuam a experiência de gerações. A tradição é um meio de lidar com o tempo e o espaço, inserindo qualquer atividade ou experiência particular na continuidade do
passado, presente e futuro, os quais, por sua vez, são estruturados por práticas sociais recorrentes (Giddens, 1990, pp. 37-8). A modernidade, em contraste, não é definida apenas como a experiência de convivência com a mudança rápida, abrangente e contínua, mas é uma forma altamente reflexiva de vida, na qual: as práticas sociais são constantemente examinadas e reformadas à luz das informações recebidas sobre aquelas próprias práticas, alterando, assim, constitutivamente, seu caráter (ibid., pp. 37-8) Giddens cita, em particular, o ritmo e o alcance da mudança - "à medida em que áreas diferentes do globo são opostas em interconexão umas com as outras, ondas de
transformação social atingem virtualmente toda a superfície da terra" - e a natureza das instituições modernas (Giddens, 1990, p. 6). Essas últimas ou são radicalmente novas, em comparação com as sociedades tradicionais (por exemplo, o estado-nação ou a mercantilização de produtos e trabalho assalariado), ou têm uma enganosa continuidade com as formas anteriores (por exemplo, a cidade), mas são organizados em torno de princípios ba stante diferentes. Mais importantes são as transformações do tempo e do espaço e o que ele chama de "desalojamento do sistema social" - a "extração" das relações sociais dos contextos locais de interação e sua reestruturação ao longo de escalas indefinidas de espaço-tempo"(ibid., p. 21). Veremos todos esses temas mais adiante. Entretanto, o ponto geral que gostaria de enfatizar é o das 'descontinuidades': Os modos de vida colocados em ação pela modernidade nos livraram, de uma forma bastante inédita, de todos os tipos tradicionais de ordem social. Tanto em extensão, quanto em intensidade, as transformações envolvidas na modernidade são mais profundas do que a maioria das mudanças características dos períodos anteriores. No plano da extensão, elas serviram para estabelecer formas de interconexão social que cobrem o globo; em termos de intensidade, elas alteram algumas das características mais íntimas e pessoais de nossa existência cotidiana (Giddens, 1990, p. 21). David Harvey fala da modernidade como implicando não apenas "um rompimento impiedoso com toda e qualquer condição precedente", mas como caracterizada por um processo sem-fim de rupturas e fragmentações internas no seu próprio interior" (1989, p.12). Ernest Laclau (1990) usa o conceito de "deslocamento". Uma estrutura deslocada é aquela cujo centro é deslocado, não sendo substituído por outro, mas por "uma pluralidade de centros de poder". As sociedades modernas, argumenta Laclau, não têm nenhum centro, nenhum princípio articulador ou organizador único e não se desenvolvem de acordo com o desdobramento de uma única "causa" ou "lei". A sociedade não é, como os sociólogos pensaram muitas vezes, um todo unificado e bem delimitado, uma totalidade, produzindose através de mudanças evolucionárias a partir de si mesma, como o desenvolvimento de uma flor a partir de seu bulbo. Ela está constantemente sendo "descentrada" ou deslocada por forças de si mesma. As sociedades da modernidade tardia, argumenta e le, são caracterizadas pela "diferença"; elas são atravessadas por diferentes divisões e antagonismos sociais que produzem uma variedade de diferentes "posições de sujeito" - isto é, identidades - para os indivíduos. Se
tais sociedades não se desintegram totalmente não é porque elas são unificadas, mas porque seus diferentes elementos e identidades podem, sob certas circunstâncias, ser conjuntamente articulados. Mas essa articulação é sempre parcial: a estrutura da identidade permanece aberta. Sem isso, argumenta Laclau, não haveria nenhuma história. Esta é uma concepção de identidade muito diferente e muito mais perturbadora e provisória do que as duas anteriores. Entretanto, argumenta Laclau, isso não deveria nos desencorajar: o deslocamento tem características positivas. Ele desarticula as identidades estáveis do passado, mas também abre a possibilidade de novas articulações: a criação de novas identidades, a produção de novos sujeitos e o que ele chama de "recomposição da estrutura
em torno de pontos nodais particulares de articulação" (Laclau, 1990, p.40). Giddens, Harvey e Laclau oferecem leituras um tanto diferentes da natureza da mudança do mundo pós-moderno, mas suas ênfases na descontinuidade, na fragmentação, na ruptura e no deslocamento contêm uma linha comum. Devemos ter isso em mente quando
discutirmos o impacto da mudança contemporânea conhecida como "globalização".
c) o que está em jogo na questão das identidades
Até aqui os argumentos parecem bastante abstratos. Para dar alguma idéia de como eles se aplicam a uma situação concreta e do que está "em jogo" nessas contestadas definições de identidade e mudança, vamos tomar um exemplo que ilustra as conseqüências 'políticas' da fragmentação ou "pluralização" de identidades. Em 1991, o então presidente americano, Bush, ansioso por restaurar uma maioria conservadora na Suprema Corte americana, encaminhou a indicação de Clarence Thomas, um juiz negro de visões políticas conservadoras. No julgamento de Bush, os eleitores brancos (que podiam ter preconceitos em relação a um juiz negro) provavelmente apoiariam Thomas porque ele era conservador em termos de legislação de igualdade de direitos, e os eleitores negros (que apóiam políticas liberais em questões de raça) apoiariam Thomas porque ele era negro. Em síntese, o presidente estava "jogando o jogo das identidades". Durante as "audiências" em torno da indicação, no Senado, o juiz Thomas foi acusado de assédio sexual por uma mulher negra, Anita Hill, uma ex-colega de Thomas. As audiências causaram um escândalo público e polarizaram a sociedade americana. Alguns negros apoiaram Thomas, baseados na questão da raça; outros se opuseram a ele, tomando como base a questão sexual. As mulheres negras estavam divididas, dependendo de qual identidade prevalecia: sua identidade como negra ou sua identidade como mulher. Os homens negros também estavam divididos, dependendo de qual fator prevalecia: seu sexismo ou seu liberalismo. Os homens brancos estavam divididos, dependendo, não apenas de sua política, mas da forma como eles se identificavam com respeito ao racismo e ao sexismo. As mulheres conservadoras brancas apoiavam Thomas, não apenas com base
em sua inclinação política, mas também por causa de sua oposição ao feminismo. As feministas brancas, que freqüentemente tinham posições mais progressistas na questão da raça, se opunham a Thomas tendo como base a questão sexual. E, uma vez que o juiz Thomas era um membro da elite judiciária e Anita Hill, na época do alegado incidente, uma funcionária subalterna, estavam em jogo, nesses argumentos, também questões de classe social. A questão da culpa ou da inocência do juiz Thomas não está em discussão aqui; o que está em discussão é o "jogo de identidades" e suas conseqüências políticas. Consideremos os seguintes elementos: . As identidades eram contraditórias. Elas se cruzavam ou se "deslocavam" mutuamente. . As contradições atuavam tanto "fora", na sociedade, atravessando grupos políticos estabelecidos, 'quanto' "dentro" da cabeça de cada indivíduo. . Nenhuma identidade singular - por exemplo, de classe social - podia alinhar todas as diferentes identidades com uma "identidade mestra", única, abrangente, na qual se pudesse, de forma segura, basear uma política. As pessoas não identificam mais seus interesses sociais exclusivamente em termos de classe; a classe não pode servir como um dispositivo discursivo ou uma categoria mobilizadora através da qual todos os variados interesses e todas as variadas identidades das pessoas possam ser reconciliadas e representadas. . De forma crescente, as paisagens políticas do mundo moderno são fraturadas dessa forma por identificações rivais e deslocantes - advindas, especialmente, da erosão da "identidade mestra" da classe e da emergência de novas identidades, pertencentes à nova base política
definida pelos novos movimentos sociais: o feminismo, as lutas negras, os movimentos de libertação nacional, os movimentos antinucleares e ecológicos (Mercer, 1990). . Uma vez que a identidade muda de acordo com a forma como o sujeito é interpelado ou representado, a identificação não é automática, mas pode ser ganhada ou perdida. Ela tornou-se politizada. Esse processo é, às vezes, descrito como constituindo uma mudança de uma política de identidade (de classe) para uma política de 'diferença'. Posso agora esquematizar, de forma breve, o restante do livro. Em primeiro lugar, vou examinar, de uma forma um pouco mais profunda, como o conceito de identidade mudou:
do conceito ligado ao sujeito do Iluminismo para o conceito sociológico e, depois, para o do sujeito "pós-moderno". Em seguida, o livro explorará aquele aspecto da identidade cultural moderna que é formado através do pertencimento a uma cultura 'nacional' e como os processos de mudança - uma mudança que efetua um deslocamento - compreendidos no conceito de "globalização" estão afetando isso.

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PROXIMO9 TEXTO

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Alain Touraine

Uma visão crítica da modernidade
Pergunta:

O que explicaria o fato de alguns autores passarem a considerar que a Modernidade já teria cumprido o seu papel e poderíamos abandonar a idéia (ou ideologia ) Moderna (modernista ou da modernidade) transformando-na (ou a substituindo) por uma idéia de pós-modernidade?
Vejamos o texto de Gilberto Velho, Individualismo e Cultura.
... as fronteiras entre uma sociedade “não-complexa” e uma complexa são sempre arbitrárias e problemáticas. Que critérios e variáveis serão determinadas? A divisão social do trabalho atingindo um grau X de especialização? O aparecimento de classes sociais nos termos de Engels? O desenvolvimento da vida urbana? O aparecimento da escrita? O advento do Estado? Algum tipo de desenvolvimento tecnológico à la Leslie White? As preferências e ênfases variam na avaliação de qual desses fatos ou variáveis pode ter um papel mais crucial na caracterização de uma sociedade complexa. Sem querer inventar nada de novo ou original gostaria que ficasse claro, quando me referir neste artigo a sociedade complexa que tenho em mente, a noção de uma sociedade na qual a divisão social do trabalho e a distribuição de riquezas delineiam categorias sociais distinguíveis com continuidade histórica, sejam classes sociais, estratos, castas. Por outro lado, a noção de complexidade traz também a idéia de uma heterogeneidade cultural que deve ser entendida como a coexistência, harmoniosa ou não, de uma pluralidade de tradições cujas bases podem ser ocupacionais, étnicas, religiosas etc. (Velho, 2002, p.15).
As sociedades complexas seriam as sociedades marcadas pelo:

1- divisão social do trabalho;
2- a distribuição de riquezas delineiam categorias sociais distinguíveis com continuidades histórica
3- heterogeneidade cultural

O que é a crítica da Modernidade?
O que Touraine entende por Modernidade?

► triunfo da razão sobre as tradições
► da ação científica ou tecnológica sobre os sistemas de controle social e cultural
► do universalismo sobre o particularismo
► da produção sobre a reprodução
► pelo conflito com aquilo que considera irracional
► pelo progresso contra os obstáculos a mudanças necessárias
► A modernidade implica em uma visão dinâmica. Isso poderia induzir a pensar em mudanças permanentes, mas não é o que ocorre porque ela é completada por uma representação da ordem social, necessária. §3- politicamente, modernidade significa identificação da ação voluntária com as leis naturais da história. Ex.: Marx
§4- modernidade significa, para a vida privada:
- liberação face a normas repressivas
- tolerância
- respeito a minorias
- visão positiva do prazer, do sexo etc...
Fraquezas da modernidade

► começa a racionalização como princípio
► depois ela deixou de ser princípio porque foi reduzida à mera instrumentalidade
► mundo administrado (explica-se tudo, controla-se tudo)
► utilitarismo (uso da razão e da ciência para a dominação, destruição dos verdadeiros valores racionais).
► a razão subjetiva é, de fato, o triunfo da irracionalidade
► a razão subjetiva é, de fato, o triunfo da irracionalidade
Porque:
► é o momento da massificação
► da subordinação da produção às demandas do mercado
► do erotismo barato
► do massacre do indivíduo e da autonomia verdadeiras
► Cria-se a nostalgia da racionalidade objetiva e crítica e de
um mundo racional criado por um logos no qual:
► há o bem coletivo
► o bem comum
► a felicidade de todos almejada por uma razão que busca universalizar-se

A razão moderna levada a extremo tornou-se a negação da própria razão e dos valores defendidos pela própria modernidade
Nietzsche e Freud (considerados pós modernos por Touraine)
► eliminação do sujeito visto por eles como ilusão perigosa
► também considerados instrumentos de repressão dos impulsos naturais pelos dispositivos de controle social
Foucault:
► subjetivação é a subordinação dos indivíduos à utilidade social, a transformação de seres humanos em objetos sociais

Parte IV – a criação da pós-modernidade
§1- muitos autores abandonam a idéia de modernidade
Criam a pós-modernidade – atestando a decomposição da modernidade.
Os intelectuais [a vanguarda iluminada] perderam papel

§2- os atores defendem seus interesses com todos os seus preconceitos e quando chegam ao poder, constroem regimes autoritários

§3- a ideologia modernista (sic, poderia dizer da modernidade) desaparece. Poucos cientistas sociais pensam que abundância, democracia e felicidade pessoal progrediram juntas.

A modernidade é cada vez mais identificada com forças de mercado impessoais, com poder militar enquanto a subjetividade parece ligar-se à defesa anti-modernista de uma identidade individual ou coletiva ameaçada.


Os liberais facilmente esquecem que uma vasta maioria não participa no mercado, e que as forças políticas populistas, fundamentalistas e opressivas dominam a maior parte do mundo enquanto as economias de mercado são incapazes de deter o crescimento da pobreza e da marginalidade;

movimentos neo-comunistas subordinam o comportamento humano ao que chamam de tradição ou sistema de valores, não tendo estes nenhuma realidade histórica e sendo usados principalmente como racionalização de um poder despótico” (p.37).
Parte V- Os perigos do abandono da concepção de modernidade

§1- O autor afirma que a decomposição do conceito clássico de modernidade nos deixa numa situação perigosa. Escolher entre:

uma visão objetiva da modernidade = crescimento de grandes organizações e exaltação do poder e da abundância X uma visão subjetiva = conformidade à normas comunitárias e repressão das demandas individuais.

O pós-moderno (pós modernismo) é uma definição negativa de uma cultura incapaz de defender-se contra as forças acima mencionadas
Parte VI – relação entre racionalização e subjetivação

§1- Pergunta sobre a relação entre racionalização e subjetivação, qual seria a relação entre o conteúdo crítico da modernidade e sua referência positiva ao sujeito e sua liberdade?

§2- diz que a resposta não é filosófica, mas sociológica

Def. racionalização como realização, objetivo comum para todos os atores de uma sociedade moderna.
A identificação de modernidade com racionalidade corresponde a interesses e ideologias das elites dirigentes.
A liberdade pessoal corresponde a interesses e orientações de grupos ou indivíduos dominados. A questão seria sociológica porque o sujeito é um movimento social.

§3- o conflito que há entre modernidade = racionalidade X movimentos comunitários não é cultural, mas social

Parte VII – racionalização e liberdade

§1- o conflito social pode se tornar em contradição cultural quando um dos lados se identificam totalmente com o que propõe
O que deve haver é uma oscilação constante entre o eu e o nós, entre a racionalização e a liberdade

§2- o grau de modernidade pode ser definido pela capacidade de grupo ou indivíduo combinar racionalidade mais especificidade cultural. Integrar universalismo + particularismo
Parte VIII - conclusão

§1- Para Touraine, a visão historicista da modernidade, a identificação de racionalização + realização + individualismo perdeu sua auto-confiançaEla não pode ser restaurada porque também houve o declínio ou desintegração de regimes e ideologia voluntaristasTambém a chamada crise do capitalismo e do imperialismo foi incapaz de demonstrar a identificação entre regimes revolucionários e liberdade pessoal.

“Há um século atrás [o texto é de 1990], muita gente acreditava na identificação entre crescimento econômico e liberdade pessoal, e isto era chamado de progresso. Atualmente, se um número crescente de pessoas em todo o mundo confia na economia de mercado, nos regimes democráticos não autoritários e na tolerância cultural, muito poucas identificam essa visão liberal orientada para o consumo com a idéia de progresso. Elas a defendem, sobretudo, por ser um obstáculo ao poder autoritário ou totalitário”.
3- Invés de tal visão deveríamos considerar como modernos os sistemas sociais que reconhecem melhor as relações complementares e conflitantes entre racionalização e subjetivação.

“No final do século XIX, chamávamos corretamente de “progressistas” os primeiros passos rumo à democracia industrial e ao Estado de Bem-Estar Social. Por que não deveríamos defender semelhantes concepções hoje, e considerar como modernas todas as formas de combinação entre eficiência econômica e direitos humanos, entre valores universalistas e experiências específicas e tradições culturais, afim de evitar a perigosa ruptura entre elites hegemônicas, políticas, econômicas, e grupos dominados em busca de identidade?”
Como eu cheguei a estas conclusões/respostas?

Fiz a análise estrutural do texto de Alain Touraine.

Parte I- Definição de modernidade

Parte II – fraquezas da modernidade

Parte III – A sociologia e o embate entre sistema e atores

Parte IV – a criação da pós-modernidade

Parte V- Os perigos do abandono da concepção de modernidade

Parte VI – relação entre racionalização e subjetivação

Parte VII – racionalização e liberdade

Parte VIII - conclusão
Pergunta:

O que explicaria o fato de alguns autores passarem a considerar que a Modernidade já teria cumprido o seu papel e poderíamos abandonar a idéia (ou ideologia ) Moderna (modernista ou da modernidade) transformando-na (ou a substituindo) por uma idéia de pós-modernidade?



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PROXIMO TEXTO

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Identidades e diferenças
O estado burguês liberal não cumpriu o que prometeu
Igualdade
Liberdade
Dignidade a todos
Definição de liberdade
A liberdade e a igualdade definidas como:
1-competição
2- mérito
3- acúmulo de bens
4- direito de propriedade.
Liberdade e igualdade associadas a interesses individuais e privados

Como resolver o problema resultante deste dilema: da liberdade e da igualdade resultaram: desigualdade e violência?
 A defesa dos interesses se vinculam a uma política de grupos

 A questão das identidades se apresentam com força e como forma de articulação de interesses comuns (comunidade de destino, identidades culturais, identidades raciais etc...)
 Respostas dos não liberais – multiculturalistas
 1- Will Kymlicka
 2- Marion Iris Young
 3- Charles Taylor

 Respeito às diferenças e políticas baseadas no direito à diferença

Como construímos nossa identidade?
►Quando nascemos recebemos um nome sentido e um sobrenome história da família
► Quando crescemos, ganhamos um número de identificação
► Algumas mulheres, quando se casam, assumem o nome da família do marido
► crescemos aprendendo a nos diferenciar dos outros. Quando crianças, ouvidos de nossos pais: “não faça isso porque parece criança sem educação”. Aprendemos que existem crianças com educação e crianças sem educação
►vamos a escola e ouvimos dos professores que “esse aluno é bom, não me dá trabalho, é inteligente e bem comportado”. Aprendemos que existem os alunos que dão trabalho e os que não dão, os bem comportados e os que não são bem comportados.
► ouvimos jovens e moças: que menina bonita! Que menino bonito! Como fulano é feio, como beltrana é feia! Aprendemos que existem pessoas bonitas e pessoas feias.
► quando jovens, ouvimos: Fulano e popular, beltrano é Nerd, cicrano é cdf, beltrana é patricinha, cicrano é mauricinho. Aprendemos que podemos ser patricinhas, nerds,
► quando adultos aprendemos que fulano tem status beltrano não tem. Cicrana tem classe, beltrana não tem. Fulano é fino, beltrano grosseirão... Aprendemos que existem pessoas com status, finas, de classe e pessoas diferentes dessas.
 Ao longo de toda a nossa vida nos é ensino e mostrado que a identidade é marcada pela diferença

 ►Sabemos quem somos e construímos nossa imagem com base na relação direta com aquilo que é diferente de nós, ou seja, com aquilo que não somos.
 Kathryn Woodwad discute que a identidade se alicerça em algumas questões:
Pode ser essencialista ou não essencialista

 Essencialista = traços imutáveis que definiriam a todo um grupo da mesma forma em todas as épocas

 Não essencialista = esses traços variariam tanto dentro do grupo quanto em relação a outros grupos, em épocas diferentes
Pode ser baseada na natureza, etnia relações de parentesco

(raça – negra, branca, amarela, indígena; etnia – sérvios, croatas, tutsis, hutus) e nas relações de parentesco (genealogia das famílias)

A identidade se vincular a questões nacionais – identidade nacional

(uma história comum, um passado comum, uma herança comum). Identidade do brasileiro seria diferente dos argentinos, dos alemães, dos franceses Como seria cada povo?

A identidade também se constrói a partir de condições sociais e materiais = quem será incluído e quem será excluído


1 Ou seja, a diferença é sustentada pela exclusão: se você é sérvio não pode ser croata.

1- A identidade seria fixa ou mutante?

2- É possível pensar identidades fora do circuito da cultura, ou seja, sem vincular identidades a representações culturais?
Pensemos nos exemplos dados nos filmes:
 1- o macho ocidental John Wayne Versus Brokeback Mountain –
2- a mulher ideal: Mulheres perfeitas versus
 “ A representação, compreendida como um processo cultural, estabelece identidade individuais e coletivas e os sistemas simbólicos nos quais ela se baseia fornecem possíveis respostas às questões: Quem eu sou? O que eu poderia ser? Quem eu quero ser? Os discursos e os sistemas de representação constroem os lugares a partir dos quais podem falar. Por exemplo, a narrativa das telenovelas e a semiótica da publicidade ajudam a construir certas identidade de gênero”. p. 17

 “Em momentos particulares, as promoções de marketing podem construir novas identidade como, por exemplo, o novo homem das décadas de 1980 e de 1090, identidades das quais podemos nos apropriar e que podemos reconstruir para nosso uso. A mídia nos diz como devemos ocupar uma posição-de-sujeito particular – o adolescente “esperto”, o trabalhar em ascensão ou a mãe sensível. Os anúncios só serão “eficazes” no seu objetivo de nos vender coisas se tiverem apelo para os consumidores e se fornecerem imagens com as quais eles possam se identificar” (p. 17/18)

Como a diferença é marcada em relação à identidade?
Sistema classificatórios
“ As identidades são fabricadas por meio da marcação da diferença. Essa marcação da diferença ocorre tanto por meio de sistemas simbólicos de representação quanto Por meio de formas de exclusão social . A identidade não é o oposto da diferença: a identidade depende da diferença”.
 Cada sociedade tem o sistema de classificação, diferenciação, inclusão, exclusão.
 As classificações são essenciais para a organização cultural e social. Contudo a exclusão não.
 As classificações estão vinculadas a ritos de passagens e a símbolos
 Casados ou não, festa de debutante, primeira comunhão etc...
 Os alimentos e o que comemos – Levi Strauss – somos o que comemos (judeus, muçulmanos, japoneses, brasileiros etc...)

 A IDENTIDADE SE CONSTRÓI POR MEIO DE IDENTIFICAÇÕES
“ A cultura molda a identidade ao dar sentido à experiência e ao tornar possível optar, entre as várias identidades possíveis, por um modo específico de subjetividade – tal como a da feminilidade loira e distante ou a da masculinidade ativa... Somos constrangidos, entretanto, não apenas pela gama de possibilidades que a cultura oferece, isto é , pela variedade de representações simbólicas, mas também pelas relações sociais”. (p. 18/19).
 “Os sistemas simbólicos fornecem novas formas de se dar sentido à experiência das divisões e desigualdades sociais e aos meios pelos quais alguns grupos são excluídos e estigmatizados”. (p. 18)

Políticas de reconhecimento ou políticas de identidade
Para Taylor, o reconhecimento da identidade ocuparia em nossas sociedades o mesmo lugar outrora ocupado pelos conceitos de dignidade humana ou dignidade do cidadão formulada pelos filósofos ilustrados e segundo o qual a posse de dignidade ou o senso moral tornariam todos os homens iguais.
Se outrora a identidade era utilizada para oferecer unidade ao estado sob a rubrica do nacionalismo e do apagamento das diferenças, hoje, nas sociedades simultaneamente fragmentadas (em função de suas divisões internas) e globalizadas (em função de processos que deslocam as fronteiras nacionais por meio de uma nova lógica de espacial), o potencial de constantes reformulações necessárias para a composição de identidades é o que tem permitido que essas mesmas sociedades de mantenham. As identidades locais ou híbridas reivindicam seu reconhecimento contra a nova homogeneidade que se insinua com a tópica global.
A partir disso, dois movimentos podem ser vislumbrados: um é o da tensão que se estabelece entre os estados nacionais, as identidades nacionais versus a globalização e ou outro e o que se surge das identidades locais ou híbridas em contraposição tanto ao nacionalismo quanto à globalização.

Castells afirma que há três tipos de identidade:

 1- Identidade Legitimadora:
 2- Identidade de Resistência
 3- Identidade de Projeto
 (CASTELLS, 1999, p.24).


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