segunda-feira, 6 de julho de 2009

Agência reguladora: perigo aos princípios da democracia? Por Jony Rodrigues

Trabalho apresentado na Disciplina de Gestão de Processos e Tecnologia da Informação, 2006

Agência reguladora: perigo aos princípios da democracia?


Por Jony Rodrigues1


No correr da década de 1990, no Brasil, a tarefa mais importante na perspectiva política parece ter sido as ações no sentido de transformar a lógica e a organização do Estado, provocando mudanças no seu funcionamento e no modo de intervenção na esfera administrativa, econômica e social. Em 1995, imbuído de grande legitimidade, política e eleitoral, e em clima de "hiper-presidencialismo", Fernando H. Cardoso assume a presidência do Brasil e acentua o processo de reformas. As áreas de atuação do Estado foram redefinidas e um dos caminhos adotados foi a privatização.


Assim, com a extinção e/ou transferência total ou parcial do monopólio estatal de alguns serviços para o setor privado, foram instituídas no ordenamento jurídico brasileiro as chamadas agências reguladoras. As funções precípuas dessas agências são a de regulamentar e controlar a execução dos serviços objetos de delegação, de concessão ou permissão, retirando do executivo tais funções.


No entanto, em face ao papel das agências reguladoras, questões são aventadas: Podem tais instituições ter independência para estabelecer políticas, uma vez que seus diretores não são eleitos e, em extensão, não sofrem controle popular? Seriam suas atribuições excessivas?
Estes questionamentos ganham maior sentido se analisarmos a recente "crise" no setor aéreo brasileiro, sobretudo no que tange a regulação no mercado de aviação civil
1. Nos últimos anos, muitas companhias aéreas, em ambiente de alta competitividade, passaram dificuldades em atender a crescente demanda pelo serviço, levando empresas a crise financeira e a bancarrota. Como foi o caso da companhia aérea Varig, e hoje a BRA.


Neste contexto, os usurários são os mais prejudicados, pois na tentativa de obterem maior lucratividade as empresas aéreas sobrecarregam ao máximo o sistema, reduzindo seus custos e elevando ao máximo o número de passageiro por aeronaves; realizando práticas lesivas ao consumidor como overbooking, cancelamento de rotas de vôo etc.


Desta forma, tende-se a questionar a capacidade que a ANAC tem de regular a aviação civil, a contento. Afora de que a sociedade não pode responsabilizar diretamente os diretores, Isso porque de acordo com a Lei 11.182 de 2005 estes são protegidos por mandatos e não há mecanismos efetivos que os tornem objeto de controle social, político ou público.


Foi o que ponderou recentemente o presidente Luis Inácio Lula da Silva, referindo-se aos diretores da ANAC: "Não é possível que um presidente da República, eleito, que tem que prestar contas à população, tenha menos poder do que um diretor que foi indicado para um mandato de cinco anos e não pode ser demitido" Ao nosso ver, o presidente parece ter razão, uma vez que no Brasil as agências reguladoras em geral, e a ANAC em particular, além da autonomia financeira-adminstrativa possuem autonomia política.


Aos olhos do professor Bresser Pereira, as agências reguladoras (exceto nos casos em que o setor regulado é monopolista), embora tenham esse nome deveriam agir como agências executivas e ter como função precípua apenas implementar as políticas constituídas por entes eleitos democraticamente: "as agências [reguladoras], em sua grande maioria, são ou devem ser ´agências executivas' que implementam as políticas regulatórias decididas pelo Congresso e pelo Poder Executivo, não se justificando que se lhes atribua autonomia política".


Nesse sentido parece descabida, no geral, a autonomia política da ANAC, e no restrito, o mandato do diretor desta agência que impede que sejam removidos dos cargos. Ademais, dar autonomia política a essas agências, no sentido de afastar seus gestores do controle público parece ser perigoso (afora de antidemocrático), isso devido a aparente proximidade que parece existir entre interesses públicos e privados na cúpula decisória dessas instituições. Como observou Fernando Herren Aguillar: "Verifica-se regularmente uma grande promiscuidade na ocupação de cargos públicos por parte de empresários privados ou profissionais liberais, que costumam retornar à iniciativa privada após seus mandatos, para desempenhar a função de consultores de empresas privadas".
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Ainda nesta perspectiva, é preocupante as denúncias que pesam sobre alguns diretores da ANAC, segundo as quais estes recebiam benesses das companhias aéreas, como passagens gratuitas. Ora, embora isso não se configure ato delituoso é no mínimo antiético o controlador do sistema aceitar cortesias do controlado.


Diante do exposto, ao nosso ver, se faz necessário mudanças na legislação no sentido de aumentar-se o controle social e a responsabilização da ANAC. Pois, segundo a lógica e a força da democracia os governantes devem responder as leis e aos eleitores, neste sentido, não existe razão para acreditar que os técnicos sejam mais confiáveis do que os políticos. Pois ambos são passíveis de serem corrompíveis pelas empresas reguladas. Dentro disso, minhas propostas são as seguintes:


A primeira caminha na direção de mudanças no art. 14 da 11.182, de modo a permitir a revogabilidade do mandato dos diretores da ANAC e a instituição dentro deste ente regulador de um Ombudsman público cujas atribuições seriam receber e apurar as reclamações dos usuários, tanto contra a atuação da ANAC quanto contra a atuação dos entes regulados e encaminhá-las ao poder legislativo. Assim, em caso de ilegalidade ou prejuízos ao interesse público caberia ao Congresso Nacional votar e destituir os diretores de seus postos.


E por fim, uma outra proposta seria compelir a ANAC a realizar consultas públicas, antes de deliberar sobre assuntos de importância que afetem diretamente os interesses dos consumidores, usuários ou empresas. Como por exemplo, atos ou alterações normativas. Além disso, deve se estabelecer a possibilidade das entidades de proteção ao consumidor, através de especialista que atuem junto com a ANAC a fim de assessorá-la tecnicamente.


1 Citado por Luiz Carlos Bresser Pereira no artigo Agências e agências, Folha de S.Paulo, 13.8.2007.
2 AGUILLAR, Fernando Herren. Controle social de servico publicos. Sao Paulo: Max Limonad, 1999, 302 p.

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