Preceito constitucional e realidade: um hiato.
Por Jony Rodrigues1
O art. 207º da Constituição Federal estabelece que as universidades devem obedecer ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. No entanto, se analisarmos as repercussões das reformas universitárias, sobre esse princípio, ocorridas a partir da segunda metade da década de 1990, perceberemos um hiato entre o que diz a lei (constituição) e a realidade institucional do sistema universitário, modificada por um conjunto de leis ordinárias.
Neste período as mudanças no ensino superior ocorreram inseridas no contexto da reforma do Estado – empreendida com ênfase no governo Fernando Henrique Cardoso – e tiveram origem na promulgação da LDB , em 1996, que somada a um conjunto de instrumentos legais, posteriormente implementados, criaram os meio necessários para uma nova (re)configuração da educação superior brasileira.
Dentre estes instrumentos legais, o que teve maior impacto sobre o disposto no art. 207, é o decreto lei nº 2.306 de 1997, que estratifica as IES – Instituições de Ensino Superior – e inseri uma nova figura jurídica: o centro universitário.
Com tal estratificação, fica estabelecido que somente as universidades são obrigadas a possuir em conjunto três funções: o ensino, a pesquisa e a extensão. O centro universitário deve proporcionar um "ensino de excelência". As faculdades integradas simplesmente têm que formar pessoas. E os institutos superiores de educação ficam predominantemente com os cursos de formação de professores.
O objetivo desta reforma a "conta-gotas" era adequar o sistema à realidade, ampliando o acesso ao ensino superior – uma vez no Brasil apenas 10% das pessoas entre 18 e 24 anos tem acesso a este nível de ensino.
Porém, o que se viu foi um aumento na propagação de IES privadas. Onde muitas delas, embora com status de universidades – como é o caso dos "centros universitários" – não priorizam a tríade: ensino pesquisa e extensão. (O censo educacional de 2005, mostra que de um total de 2.165 IES existentes, 1.934 eram privadas, ou seja, 89 %!)
Desta forma, os resultados mais visíveis da "reforma universitária", na década de 90, foram dois: O primeiro é um ajuste do sistema de ensino superior às necessidades do mercado, pois este passa a comercializar os serviços de ensino universitário, mas sem os custos da pesquisa e da extensão. O que propiciará um maior lucro.
O segundo resultado é a instituição, via leis ordinárias, de uma nova tipologia para ensino superior brasileiro, baseada diversificação e diferenciação das IES, que requer uma "relativização" (ou ruptura) do princípio constitucional da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.
1- Artigo apresentado na disciplina de Direito Constitucional, 2007.
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